Por Charles Ryrie
Considere essa história: dois alunos, um sempre com nota 10 e outro sempre com exames finais e recuperações para ser aprovado. O primeiro nunca tirou uma nota que não fosse 10 em toda sua vida escolar, enquanto o segundo sempre teve dificuldades em ser aprovado, desde o primeiro ano do ensino fundamental. Certo semestre ambos estavam, durante a universidade, na mesma classe. Os dois estavam com dificuldades: o aluno nota 10 tinha chance de não tirar 10, enquanto o aluno que sempre teve dificuldades na escola talvez não fosse aprovado naquela matéria.
O semestre termina e ambos estão ansiosos para ver suas notas. Agora, suponha que o professor chegue ao aluno nota 10 e diga: “eu tenho boas novas para você. Você passou.” Para o aluno nota 10 aquela não era uma genuína boa notícia, pois a única boa notícia que ele queria ter é saber que tirou 10. No entanto, ao outro aluno, a notícia que ele passou era definitivamente muito boa. Tanto “você recebeu 10” quanto “você passou” são boas notícias [evangelho], mas com conteúdos diferentes.
Evangelho, uma palavra transliterada do grego, significa em português, boas novas. Mas boas novas sobre o quê?A boa notícia deve ser definida para responder esta pergunta. Até mesmo o Novo Testamento usa a palavra “evangelho” para diferentes propósitos. Precisamos, então, saber de fato que boa notícia é essa.
Por exemplo, em 1Tessalonicences 3.6, Paulo escreveu que Timóteo trouxe boas notícias, literalmente o evangelho, que dizia a respeito da fé e do amor que os novos convertidos tinham. Este evangelho não é sobre a salvação eterna. Este evangelho era sobre a condição espiritual dos de Tessalônica.
Paulo fala também sobre o falso evangelho dos judaizantes na Galácia (Gl 1.6). O evangelho deles, ou seja, a boa nova, incluía o requerimento de ser circuncidado para a salvação. Este não era o evangelho da graça, que claramente nos ensina que obras não fazem parte do processo de conversão.
Mais um exemplo, em Gálatas 3.8 diz: Prevendo a Escritura que Deus justificaria os gentios pela fé, anunciou primeiro as boas novas a Abraão: “por meio de você todas as nações serão abençoadas.” Em outras palavras, as boas novas são a notícia que os gentios seriam abençoados por Deus através de Abraão e, mais uma vez, não a boa nova da solução divina contra o problema do pecado.
Boas novas nos Evangelhos
No Evangelho de Mateus, a palavra evangelho aparece 4 vezes. Com exceção de uma vez, todas elas são associadas ao Reino (em Mt 26.13). Esta era a mensagem de João Batista (Mt 3.1-2), de nosso Senhor (Mt 4.17) e dos doze discípulos quando eles foram pela primeira vez enviados por Jesus (Mt 10.5-7).
Qual a boa nova do Reino? A resposta correta está no significado de Reino e esperança que o povo judeu tinha no tempo da primeira vinda de Cristo. De fato, a esperança deles estava no cumprimento da promessa sobre o Messias e Seu Reino na terra, um Reino que exaltaria o povo judeu e os libertaria do domínio de Roma sobre o qual eles viviam.
Mas o domínio do céu não veio na primeira vinda de Jesus, porque o povo recusou-se em arrepender-se e satisfazer as condições espirituais para o Reino. A maioria apenas queria o benefício político sem satisfazer nenhum requerimento pessoal para mudança de vida. Assim o Reino não veio porque o povo não queria se preparar apropriadamente para isso. Isso não significa que, por causa disso, nunca haverá um Reino davídico, um tempo milenar. O Senhor ensinou que ele não surgiria imediatamente (Lc 19.11), e que Evangelho do Reino seria pregado novamente no futuro durante o período da grande tribulação (Mt 24.14). Neste tempo vindouro e perverso, Satanás e as forças do mau terão quase total liberdade para reinar, será uma bela boa notícia saber que em breve o Messias governará na terra.
Todas as referências de Mateus ao evangelho relacionam-se ao Reino, exceto por uma, Mateus 26.13. Nesta passagem o Senhor disse que sempre quando a mensagem de sua morte fosse pregada, a boa obra do derramar do perfume de Maria Madalena em sinal da antecipação da morte de Jesus seria conhecida.
O uso de Marcos sobre o termo evangelho uniformemente enfatiza a pessoa de Cristo (Mc 1.1, 14-15; 8.35; 10.29; 13.10; 14.9; 16:15). Nosso Senhor é o tema central da boa nova. Lucas também usa palavra evangelho para destacar a centralidade de Cristo nas boas novas (Lc 2.10), bem como no anúncio do reino (Lc 4.43). João não usa a palavra evangelho nenhuma vez, mas obviamente que os mais importantes ensinos sobre o novo nascimento são descritas por ele.
Boas novas nos escritos de Paulo
Paulo nos dá com precisão o evangelho que devemos pregar hoje. 1Coríntios 15.1-4: Irmãos, quero lembrar-lhes o evangelho que lhes preguei, o qual vocês receberam e no qual estão firmes. Por meio deste evangelho vocês são salvos, desde que se apeguem firmemente à palavra que lhes preguei; caso contrário, vocês têm crido em vão. Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. O evangelho é a boa notícia sobre a morte e ressurreição de Cristo. Ele morreu e vive, este é o conteúdo do Evangelho da salvação! O fato do sepultamento de Cristo prova a realidade de sua morte. Jesus não apenas dormiu e acordou mais tarde. A inclusão, em 1Co 15, de uma lista de testemunhas prova a realidade de sua morte e ressurreição. Ele morreu pelos nossos pecados e foi sepultado, estando a maioria dessas testemunhas ainda vivas quando Paulo escreveu a primeira carta inspirada à igreja de Corinto. A mesma verdade aparece numa carta posterior, à igreja de Roma: Ele foi entregue à morte por nossos pecados e ressuscitado para nossa justificação (Rm 4.25). Todo aquele que crê neste Evangelho é salvo, pois esta verdade é a boa nova da salvação, da graça de Deus (1Co 15.2).
Hoje em dia escutamos muito sobre o Evangelho total, que inclui certos ministérios do Espírito Santo. Para estes, é necessário algo mais além de crer: ter o batismo do Espírito Santo para que haja salvação. Além deste, outro segmento que também escutamos bastante é o movimento do evangelho integral (ou holístico). Este segmento inclui a redenção da sociedade junto à redenção individual. Mas Paulo diz claramente que o evangelho que salva é crer que Cristo morreu pelos nossos pecados e ressurgiu dos mortos. Este é o evangelho COMPLETO, ou sejam total e integral. Nada mais é necessário para o perdão dos pecados e o dom da vida eterna.
A questão em referência ao Evangelho
Um pouco da confusão relacionada ao significado do evangelho hoje em dia relaciona-se com a falta de clareza com que tratamos o assunto. Por exemplo: como meus pecados podem ser perdoados? O que me impede de ir para o céu? O que tem me afastado de ter a vida eterna? A resposta é pecado! Para esse problema, eu preciso uma forma de resolvê-lo. Deus declara que a morte de Seu filho proveu perdão pelos meus pecados. Pecadores necessitam de um salvador. Cristo morreu por nossos pecados – isso é tudo! Cristo é o salvador que o pecador precisa. Através da fé eu me aproprio desta salvação concedida pelo Salvador Jesus bem como o perdão dos meus pecados, assim, tendo resolvido o problema do pecado. Desta forma posso ter a certeza da promessa de Jesus: creia e terá vida eterna (muitas vezes relatado por João).
Eu não preciso crer na segunda vinda de Cristo para ser salvo. Eu não preciso recebê-lO como meu presente intercessor, mas eu preciso acreditar que Ele morreu pelos meus pecados e ressuscitou triunfantemente sobre o pecado e a morte. Eu não preciso estabelecer os padrões cristãos de se viver para ser salvo. Eu não preciso parar de fumar para ser salvo, pois isso claramente seria uma obra. Questões sobre carnalidade, espiritualidade, frutos e deslizes na vida cristã não são questões que se relacionam à salvação. Apenas o Senhor Jesus, Deus que se tornou homem, poderia e pôde resolver o problema ao morrer por nós. Ele teve de se tornar homem para poder morrer, e Ele tinha que ser Deus para que o preço do pecado do mundo fosse pago. Tenha a questão sobre a boa nova da salvação clara em sua mente.
A direção do Evangelho
A boa nova [o Evangelho] é que Cristo fez algo sobre o pecado e que Ele hoje vive para me oferecer perdão. A direção da salvação é de Cristo para mim. Nunca é de mim para Ele. Eu não consigo oferecer nada a Ele para obtenção da salvação. Aliás, o que é que eu poderia oferecê-lO para que meu problema com o pecado fosse pago? Mesmo que eu fizesse um voto e fosse capaz de mantê-lo, isso não removeria minha culpa por causa de meus pecados. Eu simplesmente não consigo oferecer nada.
Claro, quando eu recebo vida eterna de Suas mãos, eu me dobro diante de alguém infinitamente superior. Mas eu me dobro como alguém totalmente incapaz de fazer qualquer coisa para resolver meu problema com o pecado. Eu me dobro como um recipiente da graça, não como um doador de qualquer coisa. Na salvação eu sou sempre o favorecido, nunca o doador. Se eu tento agregar ou retirar qualquer coisa para ser salvo, então eu adicionei obra e a salvação já não é mais puramente graça Mantenha a direção certa e mantenha a graça livre de qualquer obra; eis o evangelho.
Fonte: What’s the Gospel [O que é o Evangelho, cap. 4], do livro “So Great Salvation.”
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