É imprescindível a leitura deste post até o final. Se começar, termine.
“Eu já amei vários homens!” Ufa, como é bom falar isso publicamente.
Sim, sou um pastor batista, atualmente estudante de pós-graduação num seminário conservador nos EUA. E você que é homem, já amou algum outro homem? Já notou quão difícil é falarmos sobre isso dessa maneira? Permita-me compartilhar um pouco dessa minha história.
Amor por homens!
A aquisição de conhecimento é pré-requisito para desenvolvermos um amor mais profundo. Intimidade é um claro resultado da disposição para amar. Entretanto, a falta dele (conhecimento) não foi problema para eu sentir uma terrível dor no dia que eu me separei do Tales. É até bizarro pensar que minha cena de lágrimas e desespero é uma das memórias mais claras do meu amigo Luís Fernando sobre mim. Ele gosta de trazer isso à tona quando comentamos sobre aquele tempo. Acho que Tales foi o primeiro homem que eu amei fora da minha família.
Paul e Dú foram os próximos. Eles eram inteligentes, gentis e divertidos. Eu era um aluno medíocre e, entre muitas outras coisas, estar mais próximo deles me trazia algum senso de segurança acadêmica. Em especial, eu me sentia muito bem ao lado deles; era gostoso. Passei várias manhãs com o Paul e vários finais de semana com o Dú. Algumas vezes estávamos todos juntos. Infelizmente, por questões geográficas, Dú teve de partir, e isso também partiu meu coração. Paul ficou mais tempo e, nessa época, conheci o Felipe.
Felipe tinha duas características que me motivavam estar perto dele. A primeira era que ele gostava muito de jogar basquete, e eu também. Passamos juntos centenas de horas treinando intensamente. Praticamos no quintal de sua casa, da minha casa, em clubes esportivos e em praças públicas. A segunda característica era seu amor por Deus. Felipe era crente e parecia conhecer a Bíblia. Por meio dele percebi que minha religiosidade tinha mais a ver comigo do que com Cristo. Com o Felipe sorri e chorei diversas vezes. Eu ainda comento com vários amigos o nosso amor. Ele foi um instrumento de Deus para que eu também me tornasse crente. Todavia, minha fé não diminuiu meu amor pelos homens, pelo contrário, trouxe ainda mais significado.
Um ano antes da minha conversão eu conheci o Dani. Além de inteligente, gentil e divertido – qualidades que eu aprecio – Dani me parecia sempre de bom humor e seu riso era contagiante. Tivemos um ano bastante intenso. Viajamos à praia juntos, fomos a danceterias juntos, almoçamos juntos, estudamos juntos e torcemos juntos pelo Brasil na Copa do Mundo. Todavia, falar do meu amor por ele é o mais complicado de todos. Em poucas palavras, no final desse ano intenso nós sabíamos que tínhamos diferentes perspectivas sobre o amor que manifestávamos um pelo outro. Então, nosso relacionamento esvaneceu.
Pouquíssimo tempo antes de eu começar meu curso universitário foi quando eu me tornei crente. Paulo já era um bom amigo antes disso, mas o tempo que passamos juntos na universidade me proporcionou desenvolver um grande amor por ele. Nosso relacionamento não terminou quando concluímos nosso curso, porém, logo depois de nos formarmos, eu me casei… Sim, eu me casei com uma bela e inteligente mulher; Karen.[1] Nas palavras do sábio, quem encontra uma esposa encontra algo excelente; recebeu uma bênção do Senhor (Pv 18.22NVI). De fato, ela é o segundo maior presente que eu já recebi de Deus.[2] Paulo foi um dos meus padrinhos de casamento.
Cada um destes homens deixou marcas indeléveis no meu coração. Uma parte muito alegre da minha história se mistura com a história deles. Eu agradeço a Deus por cada um destes homens que eu amei.
Amor por homens?
Conheço muitas outras histórias de amor de homens por outros homens, como a de Chad Ashby [clique aqui para conhecê-la – em inglês], a qual é a minha base e inspiração para este texto. Lamentavelmente, existem dois grupos que dizem ser impossível um homem amar outros homens de tal modo.
O primeiro grupo é o mundo. Ele não consegue reconhecer a possibilidade de um amor assim, sem rotulá-lo de atração homossexual. De fato, na esmagadora maioria das vezes, gay[3] é a palavra usada para descrever pessoas que amam assim.
O segundo grupo é própria igreja. Citando Ashby de forma contextualizada:
Muitas de nossas igrejas nos fazem crer que o “amor fraterno” que a Bíblia incentiva deve se desenvolver num churrasco com picanha durante um jogo clássico de futebol.
Isso me leva a pensar no entusiasmo apologético do cristão quando busca defender apropriadamente a amizade e o amor entre Jônatas e Davi: Jônatas, filho de Saul, começou a sentir uma profunda amizade por Davi e veio a amá-lo como a si mesmo (1Sm 18.1 NTLH). Enquanto é verdade que Davi e Jônatas em nada evidencia um tema homossexual, tais cristãos se esquecem de espelhar e ensinar os aspectos supraculturais dessa bela história de amor entre dois homens de Deus.
Há muita poeira (pecado) em meu armário, mas homossexualidade não é uma delas. Creio que estamos tão longe do ideal divino ou tão infectados com a maneira do mundo enxergar um genuíno amor entre dois homens, que ler essas sentenças com as palavras “amor” e “homem” soam bem estranhas.
Satanás é astuto. Dentre suas diversas mentiras, acredito que neste tópico se destacam a vergonha e a ilusão. Ele deseja que homens se sintam envergonhados ao expressar uma genuína atitude de amor, bem como satisfeitos quando manifestam um pseudo-amor.
Será que conseguiremos amar como Pedro nos ensina, visando o amor fraternal e sincero (1Pe 1.22 NVI), quando nossas decisões e ações para amar são amarradas com uma perspectiva sexual? Será que realmente entenderemos o significado de amor ao próximo, quando muito do ensino cristão possui uma visão embaçada de masculinidade? Note as palavras de Pedro: Tenha todos o mesmo modo de pensar, sejam compassivos, amem-se fraternalmente, sejam misericordiosos e humildes (1Pe 3.8 NVI – grifo meu). Infelizmente, mesmo vários cristãos enxergariam um homem caracterizado como compassivo, amoroso, misericordioso e humilde, uma figura efeminada.
Amar um homem a exemplo de Davi e Jônatas é refletir o amor de Cristo: Jesus Cristo deu a sua vida por nós, e devemos dar a nossa vida por nossos irmãos (1Jo 3.16 NVI). É necessário que desenvolvamos esse amor, mesmo quando diante de fortes campos de pressão para desistirmos.
A melhor opção que temos para provar a verdade, da possibilidade de um genuíno amor entre homens, é fazermos o que deixará nossas almas satisfeitas: obedecer o Criador. Viver à luz do Evangelho trará questionamentos ao mundo e à igreja. As verdadeiras respostas estão no Reino da Luz, cujo governo é do Senhor Jesus. É para lá que eu oro e desejo que todos vão e estejam. Que Ele me ajude a amar mais homens.
PS: As palavras da primeira parte deste post foram bem medidas. De fato, todos os exemplos expostos foram de belas e profundas amizades (dizer assim não choca, né?). A única exceção é a amizade com o Dani. Próximo ao final daquele ano, ele confessou ter atração sexual por mim. Foi difícil a manutenção da amizade por ambos os lados, tendo eu dito que era heterossexual.
————————
[1] Se Deus permitir em breve celebrarei 10 anos de casado.
[2] O primeiro maior presente que eu recebi de Deus foi a salvação por meio de Jesus Cristo, o Salvador.
[3] Vale lembrar que gay não é um termo descritivo, mas carregado de significado de identidade.
Tags: 1João 1Pedro Amor Chad Ashby Gay Homem Homossexualidade Igreja Masculinidade Mundo Provérbios
