Por Fernando Leite
A Bíblia apoia o estupro?*
Na onda do recente e trágico incidente no Rio, em que uma jovem teria sido vítima de curra, muito se fala sobre quem e o que é responsável pela cultura do estupro. É claro que cristãos não foram poupados da responsabilidade. Nada original! Mais uma aplicação da estratégia de Nero, de culpar os cristãos pelo incêndio em Roma em 19/Jul/64, que ele mesmo provocara para viabilizar seu plano de construções.
Na cauda deste incidente recebi este texto de alguém indignado com ele (veja aqui). Seu título, ‘A cultura do estupro também descansa sob a sombra da nossa leitura bíblica’ já é bastante questionável. Quem é que faz uma leitura como essa? Eu não faço! Leio muito a Bíblia, fui criado em lar que lia a Bíblia, em que minhas irmãs eram bastante respeitadas e valorizadas.
Sendo assim, sugiro algumas formas de fazer uma leitura bíblica que não distorça o sentido das Escrituras. Veremos o primeiro parágrafo que cita a passagem de Juízes 19.24-29, e sugiro que se leia a história desde o início do cap 19, e ainda do cap 20. Melhor ainda seria ler o livro inteiro para perceber seu contexto amplo, e não entender o texto fora de seu contexto.
O livro dos Juízes é um livro histórico que narra a realidade da nação de Israel, chamada para ser o povo de Deus, mas que não vivia de acordo com a aliança estabelecida por Deus. Sua liderança estava degenerada, as ordens de Deus eram desprezadas e o povo estava indisposto a confiar no Senhor. Nesta condição o povo vivia profundas crises sociais, política e espiritual, muitas vezes vivendo de forma tão ou mais perversa que as nações pagãs à sua volta.
Tentando estabelecer limites para não perder o foco, a tentativa de estupro do hóspede (19.22), a oferta do anfitrião de dar sua filha virgem e a amante de seu hóspede em troca do próprio hóspede (19.24), o ter e o ser amante, os homens da cidade abusarem da amante (19.25-26), e a matarem, são alguns dos absurdos que foram cometidos por aquele povo que rejeitava a Deus e desconsiderava as suas ordens. O livro de Juízes nos conta essa história absurda sem dar qualquer tom de normalidade ou aprovação, e muito menos normatizando essa conduta. Nessa narrativa não há qualquer sombra que possa respaldar a cultura do estupro, assim como a Lava-jato e a imprensa ao trazerem os podres do poder não está oferecendo nenhum respaldo para a cultura da corrupção.
Além do fato lamentável, absurdo e trágico que foi realizado (Jz 19), cabe atentar para a reação do povo de Israel diante da notícia. Ficaram indignados e decidiram pela pena de morte (20.10). Ao chegarem diante do lugar dos incidentes, constataram que o povo local os estava protegendo, portanto eram seus cúmplices. A decisão foi de guerrearem e punirem tanto os estupradores e assassinos, como também seus protetores e cúmplices. Neste processo, aqueles que se dispuseram a punir perderam 22.000 homens (20.21), mais outros 5.000 homens (20.25), e ainda aproximadamente outros 30 (20.31); e ainda que tenham desanimado, continuaram na lida até que eliminassem os criminosos e seus protetores.
O crime teve a mais alta punição possível. Ainda que Israel passasse por grande crise espiritual e moral, isso não foi impedimento para punir de forma tão intensa aquele estupro absurdo. Não conheço na história outra punição que tenha custado tão caro, seja para os algozes, seja para os criminosos. Aquela mulher era frágil, mas não foi a tradição judaico cristã que a levou a isso, mas, sim, a impiedade daqueles homens perversos que não davam qualquer valor à vida, à mulher e a Deus em primeiro lugar.
* Título Original. Texto retirado do Facebook.
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