Por Cole Brown
Caros colegas de ministério,
Há pouco mais de 40 dias, fui abandonado por todos os meus seguidores, condenado como criminoso e executado publicamente. Aquela foi uma semana realmente difícil. Porém, o túmulo em que eu estava agora está vazio, e eu já apareci em meu corpo glorificado a mais de 5 mil pessoas! Fico feliz em reportar que, como consequência disso, agora tenho aproximadamente 120 seguidores (embora nosso desejo é que fosse um número maior, dada a singularidade do evento da ressurreição). Quero informar que o único lugar que temos para nos reunirmos é um cômodo quente e que cheira esquisito, na parte de cima de uma casa. Claro, gostaríamos de ter um local melhor, mas queremos que vocês saibam que não estamos desperdiçando o dinheiro que vocês nos mandam. Enfim, orem por nós e, por favor, continuem mandando sustento.
Em mim,
Jesus.
É mais ou menos assim que seria se o Cristo ressurreto tivesse que escrever a versão ancestral de uma carta missionária dos nossos dias pedindo sustento. Se você já teve que levantar sustento como plantador de igreja, ou missionário transcultural, sabe quão embaraçosa pode ser a tarefa de escrever cartas assim.
Se você está do lado dos destinatários das cartas, talvez sua dúvida seja “por que tão poucas dessas correspondências soam autênticas ou significativas?” Embora elas certamente sirvam a um propósito importante – levantar mantenedores e parceiros de oração e manter nossos familiares atualizados sobre nossos ministérios –, eu sempre me pergunto se os benefícios justificam os custos; seja para quem escreve as cartas, seja para quem as lê.
Integridade da Missão
Um dos custos dessas cartas é o da integridade do trabalho que tanto o plantador de igrejas quanto os mantenedores estão fazendo juntos. Como membro do grupo dos que escrevem tais cartas, posso afirmar que muitos missionários estão tentando justificar o valor do trabalho que fazem a cada carta pedindo sustento que eles enviam.
Embora nenhum dos nossos leitores nunca tenha nos pedido para fazer isso, mesmo assim, sentimos que um dos propósitos primários das cartas é convencer centenas de parceiros de ministério do seguinte: “você não está desperdiçando seu dinheiro, então, continue nos sustentando.”
Em busca desse objetivo, nós exaustivamente vasculhamos nosso banco de memórias à procura de conversas que tivemos, eventos que organizamos ou ministérios que iniciamos, que sirvam como ilustração do valor do nosso trabalho. Às vezes essa busca é rápida e fácil, mas às vezes é dolorosamente difícil; quase sempre a tarefa é desagradável e faz com que nos sintamos sujos.
Por quê? Pelo fato de que temos uma aguda consciência de que, ao agirmos assim, transformamos o que originalmente era um trabalho motivado por amor em algo motivado por razões comerciais, em parte, por interesses próprios. Um dos grandes perigos das cartas modernas para levantamento de sustento para a obra missionária é o de transformarmos nossos ministérios em produtos a serem vendidos, em oposição a uma missão sobre a qual deveríamos orar e na qual deveríamos investir.
Integridade dos Relacionamentos
Um segundo custo é o da integridade do relacionamento entre o plantador de igreja e os parceiros. Quando escrevemos nossas cartas com notícias do ministério, às vezes omitimos intencionalmente as partes das nossas vidas e do nosso trabalho que não têm “apelo comercial”.
Por exemplo, já que um dos propósitos primários da carta é convencer as pessoas a continuar enviando sustento, nos perguntamos se seria sábio compartilhar todas as nossas experiências. Hesitamos em falar sobre nossas falhas, porque tememos que elas façam o “produto” que é o nosso ministério parecer menos atraente. Isso nos leva a ignorar os fracassos, ou minimizá-los quando os narramos.
Isso é especialmente destrutivo, porque significa que nossos parceiros no ministério não terão o privilégio de orar por nós durante os momentos em que nossas almas e ministérios mais necessitarão. Nós podemos hesitar também em compartilhar certas lutas em nossas vidas pessoais, com medo de que a honestidade a respeito de lutas no casamento, na criação dos filhos ou na fé possam levar nossos parceiros a pensar que estamos distraídos, na melhor das hipóteses, ou que sejamos desqualificados, na pior.
O resultado é que as pessoas que mais querem nos ajudar são privadas da oportunidade de fazerem isso. Estejamos certos ou errados, nos convencemos de que ninguém quer ler uma carta mensal de notícias do ministério cheia de histórias de falhas, medos, tensão nos relacionamentos, desapontamentos e fracassos. Mas essas coisas estão presentes na vida e no ministério de todo plantador de igreja.
Nós, então, caímos numa situação de “engano por omissão”, que cria distância entre o plantador de igrejas e os parceiros.
O ministério do cotidiano
Junto com a tentação de evitar compartilhar as partes duras de nossas vidas e do nosso ministério, muitas vezes vem o embaraço a respeito dos aspectos mais “ordinários” do trabalho. Começar uma igreja do nada é, normalmente, um processo lento.
Esse processo inclui incontáveis dias gastos com coisas que simplesmente não são destaques em uma carta com notícias do ministério: adaptação a uma cidade ou cultura nova, conhecer os vizinhos e os comerciantes locais, ir a eventos para ganhar a confiança de líderes locais, aprender um idioma novo, e também uma sequência infinita de idas à cafeteria local para encontrar a pessoa que estamos evangelizando, a qual pode ou não decidir que nunca mais falará conosco (que dirá a decisão sobre participar na vida da igreja que esperamos plantar justamente para alcança-la).
Às vezes, nos sentimos embaraçados em gastar tanto tempo fazendo coisas que demoram tanto para dar fruto, considerando que todo mês nós recebemos dinheiro de nossos mantenedores, os quais querem ver logo os resultados para o reino.
Outras vezes, sentimos vergonha por gastar qualquer quantia de dinheiro com algo que tenha a ver com descanso ou com curtir a vida com nossa família. Sabemos que essas coisas são pagas com dinheiro generosamente ofertado para sustentar nosso ministério. O que as pessoas diriam se elas soubessem que gastamos centenas de reais (no original em inglês, dólares) para viajar com nossos filhos após meses de lutas em meio a uma agenda saturada de eventos relacionados ao ministério?
Essa vergonha a respeito de como gastamos nosso tempo ou dinheiro frequentemente nos leva a “editar” nossas vidas, portanto, tirando dos mantenedores a oportunidade de realmente nos conhecer. Quando isso acontece, fazemos uma troca trágica: abrimos mão de uma verdadeira parceria cristã, dando lugar a uma troca superficial de informações por dinheiro.
Compartilhe sua vida (real)
Creio que precisamos de um sistema mais saudável de levantamento de sustento. Até lá, recomendo que os plantadores de igrejas se arrisquem e digam aos potenciais parceiros que as notícias “excitantes” sobre o ministério serão, provavelmente, poucas e não muito frequentes. Mas as notícias virão, mesmo assim, porque estamos mais interessados em compartilhar nossas vidas do que em vender nossos ministérios.
Da mesma forma, recomendo aos mantenedores que assegurem a seus parceiros missionários que eles estão mais interessados no relacionamento do que nos resultados. Se pudermos confiar na provisão do Senhor para fazer isso, creio que Deus será glorificado por meio do nosso ministério, não importa qual seja o tamanho.
>> Original em The Gospel Coalition
Tradução de Eduardo Tavares
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